![Serão os carros eléctricos muito avançados para os nossos tempos?](/static_assets/photos/zaptec-9166Worfn_Q-unsplash-384w.jpeg)
Se ainda existissem dúvidas que os eléctricos têm vários pontos a seu favor, os carros que têm sido anunciados e lançados para o mercado nos últimos anos provam não só isso, mas também que ainda têm muito para oferecer.
No entanto, há algumas questões que rodeiam os eléctricos que não podem ser ignoradas, especialmente por quem procura trocar de carro. Neste artigo vamos olhar para alguns desses pontos. Sendo que por “carro eléctrico” me refiro exclusivamente a carros 100% eléctricos.
Autonomia
É indiscutível que os fabricantes têm feito esforços significativos para que a autonomia dos seus veículos melhore a cada lançamento. O primeiro Nissan Leaf, de 2011, tinha uma autonomia de 117 km. Neste momento, a Nissan já tem propostas como o Ariya que oferece mais de 400 km de autonomia.
E também é verdade que nem toda a gente há-de precisar de fazer mais de 100 km por dia. Ou seja, poderia eventualmente fazer sentido adoptar um estilo de vida em que o carro ficaria a carregar na garagem durante a noite, para que no dia seguinte estivesse a 100% com outros +100 km disponíveis.
Pessoalmente, exceptuando quando vou viajar, nunca precisaria de um carro com mais de 100 km de autonomia. Por outro lado, a pressão subconsciente de que “a qualquer momento” o carro fica sem energia para se mover pode ser demasiado forte para alguns.
No entanto, ao contrário dos carros com motor a combustão interna (e sem o sistema de start and stop activo), no trânsito, os carros eléctricos podem não gastar absolutamente nada, o que se torna uma vantagem incontornável para aqueles que passam horas no trânsito diariamente. Os meus pêsames a essas pessoas.
Peso
Outro ponto fulcral dos carros eléctricos é o seu peso extra, quando comparados aos seus companheiros de estrada com motor interno a combustão. Por exemplo, o Opel Corsa 1.2 de 2020 pesa 1550 kg. Enquanto que a sua versão eléctrica de 2021 pesa 1920 kg. É um aumento de cerca de 24%!
E vocês perguntam: Mas… Oh Pedro, e qual é o problema do carro pesar mais 400 kg?
Antes de tudo, são mais 400 kg que o motor tem que puxar. Que é o equivalente a 5 pessoas de 80 kg.
A estabilidade em estrada bem como a forma como o carro se deixa conduzir é drasticamente afectada pelo peso. Claro que este ponto dependerá de carro para carro e de mais factores do que apenas o peso, como a distribuição desse peso, os pneus, ou mesmo o estado do piso.
Por falar em piso, um carro mais pesado danifica mais o terreno por onde passa — acontece frequentemente, aliás, com camiões — ainda que possa não ser muito significativo.
Mas aquele que será provavelmente o ponto mais relevante, a meu ver, é o facto de os acidentes se tornarem exponencialmente mais dramáticos, uma vez que a velocidade a que os carros circulam não muda por serem eléctricos — até atingem velocidades mais elevadas mais rápido — mas a massa que está em movimento pode ser drasticamente maior. Especialmente quando se trata de um acidente entre 2 carros eléctricos.
Força = Massa × Aceleração
Segundo o nosso amigo Newton, a fórmula da força pode ser descrita como Força = Massa × Aceleração. Portanto, sem querer entrar em detalhes matemáticos com os quais eu próprio me sentiria desconfortável, é relativamente fácil perceber que a força envolvida num acidente em que os 2 carros são significativamente mais pesados, seria bem superior. O que pode ser catastrófico para os seus passageiros e condutores.
Infraestruturas
Esta é, provavelmente, aquela que mantém mais potenciais compradores de pé atrás no nosso mercado. Já todos vimos e sentimos o quão agoniante pode ser uma ida à bomba de gasolina que tem vários carros em fila de espera. Abastecer um carro com motor de combustão interna demora segundos ou poucos minutos, no máximo — sendo que muitas vezes se fica tanto tempo à espera para pagar como para abastecer.
Por outro lado, abastecer um carro eléctrico pode levar horas! Claro que, como sabemos, há carros que suportam carregamentos rápidos. Mas ainda assim, estamos a falar de abastecimentos que podem demorar 20 ou 30 minutos. Se multiplicarmos esse valor por 4 carros que estejam eventualmente à nossa frente, vamos ficar cerca de 2 horas à espera — e apenas à espera — até começarmos a abastecer o nosso carro.
Volto a dizer que, no dia-a-dia, acredito que isto não seja um problema para a maioria das pessoas. No entanto, há vários relatos de pessoas que deixam o carro a carregar numa rua paralela a casa, por não terem forma de o carregar em casa. Histórias de quem deixou a carregar num posto de carregamento público e quando voltou, o cabo estava preso e não conseguiam ir embora. Ou mesmo pessoas que deixam o carro a carregar no posto de abastecimento mais próximo de casa, mas que ainda assim têm de voltar para casa de Uber, ou outro qualquer meio de transporte público.
Na minha humilde opinião, tudo isso está longe de poder ser considerado o futuro. Pelo menos aquele em que eu gostaria de viver.
Para quem, como eu, gostar de ir de férias para sítios algo remotos, às vezes já é stressante o suficiente apanhar uma estrada de terra batida — ou lama, se tiver chovido — até ao local, ou uma passagem mais apertada onde o carro pode não caber. Se para além disso me tivesse de preocupar em garantir que teria postos de carregamento por perto, estava bem tramado.
Há inclusivamente zonas do país onde não existem postos de carregamento rápidos, ou existindo, são raros. Seriam portanto, horas do meu dia — de férias! — que iria perder à espera que o carro carregasse. Não é minimamente prático.
Preço
Claro que, se o ponto anterior já afasta algumas pessoas, este há-de ser igualmente desmotivador.
Na Europa, os carros eléctricos podem custar cerca do dobro, em média, do que custaria um carro equivalente com motor a combustão interna.
O Renault Zoe, por exemplo, custa neste momento cerca de € 35.000 em Portugal. Por essa quantidade de dinheiro, podem comprar um Mazda CX-5 e ainda vos sobram cerca de € 500. Ressalvo que o Zoe é dos carros mais pequenos do nosso mercado e que o CX-5 é um SUV que alberga confortavelmente uma família de 4.
Creio que os números dizem mais do que eu poderia escrever aqui.
Baterias
As baterias, como qualquer outro componente eléctrico, dentro ou fora de um carro, gostam pouco de temperaturas altas ou extremamente baixas. É por este motivo, aliás, que alguns fabricantes investem em sistemas de controlo de temperatura das baterias em carros eléctricos. E faz todo o sentido. No entanto, como devem imaginar, a energia que alimenta esse sistema vem… da própria bateria.
Ainda é relativamente cedo para podermos olhar para esta questão com dados mais concretos. Mas, ainda assim, diz-se que as baterias dos carros eléctricos terão uma longevidade algures entre os 10 a 20 anos. Este facto por si só levanta várias questões, nomeadamente a questão ambiental que será abordada mais à frente.
Diz-se também que as baterias equivalem, neste momento, a cerca de 30% do valor total de um carro eléctrico. É expectável que este valor desça à medida que o tempo e a tecnologia avançam, mas neste momento ronda os 30%. Para o Renault Zoe, mencionado acima, seriam cerca de € 10.500 só para a bateria.
Ora, o meu carro actual — Volvo V50 — é de 2005. Faz daqui a 2 anos, 20 anos. Tem mais de 200.000 km e por enquanto continua a rolar. Seria impensável para mim fazer um investimento de tamanha grandeza neste carro. Por muito que goste dele, 30% do valor que ele custou na altura — que não faço ideia qual seja porque não sou o primeiro dono — há-de ser bem mais do dobro de € 10.500. Por essa quantidade de dinheiro já se encontram carros novos, ou semi-novos.
Mercado de usados
E por falar em carros semi-novos, existe neste momento um vasto mercado de carros usados a que muita gente recorre para comprar o seu carro. Tal como muitos outros recém encartados, eu não tive alternativa senão recorrer a um usado quando precisei de comprar carro pela primeira vez — um Volkswagen Polo 1.0 de 2000… que Deus nosso senhor o tenha! Quando o comprei, se não estou em erro, o carro já teria algo mais de 10 anos.
Ao eliminar os carros com motor a combustão interna do mercado de carros novos, como as normas da União Europeia ditam que se faça até 2035 — com algumas excepções que ainda estamos para ver concretamente quais são — estamos a promover que o mercado de carros usados se torne aos poucos numa sucata de carros eléctricos que precisam de uma bateria nova.
…estamos a promover que o mercado de carros usados se torne aos poucos numa sucata de carros eléctricos que precisam de uma bateria nova.
Quem é que no seu perfeito juízo vai querer comprar um carro eléctrico para lhe meter uma bateria nova, tendo em conta os orçamentos falados acima? Não só a autonomia dos carros eléctricos mais antigos não era espetacular, como a própria autonomia vai diminuindo ao longo da sua vida. Seria o equivalente a um carro com motor a combustão interna ganhar “colesterol” no depósito do combustível e diminuir significativamente a sua capacidade ao longo da vida. Impensável!
Emissões
Como disse acima, este é um dos pontos que leva muita a gente a comprar um carro eléctrico. Simplesmente por sentirem que estão a fazer “a sua parte” para reduzir as emissões, imagino eu. Mas se ignorarmos a quantidade de emissões que são emitidas — passo a redundância — para a atmosfera no processo de fabrico de um carro, e olharmos apenas para o combustível desse carro, podemos tirar algumas conclusões interessantes.
Um carro com motor a gasolina, consome gasolina, naturalmente. Neste momento não há outro tipo de gasolina disponível ao público que não se enquadre na categoria de combustíveis fósseis — que são baseados em recursos finitos.
Um carro eléctrico, por outro lado, consome energia eléctrica. Energia limpa que atrai muitos consumidores preocupados com a sua pegada ecológica.
Mas, só em 2021, e pela primeira vez, a Europa produziu mais energia eléctrica a partir de energias renováveis, por oposição a energias fósseis, como tem vindo a acontecer.
Quer isto dizer que, até 2021, a maior parte da energia eléctrica produzida na europa — nomeadamente aquela que foi usada para carregar carros eléctricos — vinha de energias fósseis em primeira instância. Mesmo agora, em 2023, grande parte dela também virá. Simplesmente já não será expectável que seja a maior parte.
Nestes moldes, custa-me muito dizer que um carro eléctrico não polui absolutamente nada, sendo que a energia que uso para o carregar é muito provável que venha de energias fósseis.
Autoestradas
Por fim, uma pequena comparação em como os carros eléctricos diferem dos carros com motor a combustão interna.
Os consumos que os carros com motor a combustão interna fazem são drasticamente melhores quando feitos em regime constante. Numa autoestrada por exemplo, a uma velocidade cruzeiro — e legal — de 120 km/h, e sem inclinação, pouco combustível será necessário para manter o carro em movimento.
Por outro lado — e por questões técnicas que eu sou incapaz de apontar — os carros eléctricos parecem ter uma performance significativamente pior nas mesmas condições.
Não deixa de ser interessante que os carros eléctricos tivessem começado por ser pequenos — e feios, diga-se — e cada vez mais se vejam carros enormes totalmente electrificados. Na minha humilde opinião, os carros eléctricos seriam bem mais benéficos nas cidades, onde há trânsito e pessoas a respirar por perto e onde é mais fácil aceder a um posto de carregamento — carros para o dia-a-dia da maior parte das pessoas, portanto.
Por outro lado, para viajar ou para distâncias mais longas, acredito que os carros com motor a combustão interna continuam a fazer mais sentido.
Até porque…
A Porsche está neste momento a testar combustíveis sintéticos que poderiam vir a mudar a forma como usamos carros com motor a combustão interna.
Combustíveis sintéticos são molecularmente muito idênticos aos combustíveis fósseis, mas bastante mais puros, contendo apenas os componentes necessários para produzir uma combustão. Não contendo a parte mais “suja” dos combustíveis fósseis, que são aliás a parte mais preocupante resultante de uma combustão de combustíveis fósseis. Pode ser uma séria proposta para que os carros como os conhecemos até hoje não acabem a partir de 2035.
Claro que neste momento estes combustíveis são ainda demasiado caros para serem sequer disponibilizados ao público. Mas se tudo correr bem, nos cerca de 10 anos que nos separam de 2035, mais fabricantes conseguirão desenvolver maiores quantidades de combustíveis sintéticos e a preços mais reduzidos.